quarta-feira, 15 de novembro de 2023

VIVA PAGU



A escritora, cartunista e jornalista brasileira Patrícia Rehder Galvão, conhecida como Pagu, é a homenageada deste ano da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), que será realizada entre os dias 22 e 26 de novembro próximo. 

Rio - Patrícia Rehder Galvão, conhecida como Pagu, foi a primeira mulher a publicar tiras em jornais.

As tiras batizadas de “Malakabeça”, “Fanika” e “Kbelluda”, foram publicadas no jornal “O Homem do Povo”.

Pagu, além de cartunista, foi escritora, poetisa, diretora, tradutora, desenhista, jornalista e, embora não tivesse participado da Semana de Arte Moderna - tinha na época apenas doze anos de idade -, foi uma das grandes mulheres do movimento modernista brasileiro, iniciado em 1922. 

O apelido Pagu surgiu de um erro do poeta modernista Raul Bopp, ao dedicar a menina que ele imaginava chamar-se Patrícia Goulart, em 1928, o poema “Coco de Pagu”.

Nascida em São João da Boa Vista, em 9 de junho de 1910, Zazá (apelido de Patrícia Galvão na infância) era a terceira de quatro irmãos de uma família de classe alta do interior de São Paulo.

Jovem, bonita e burguesa, a artista era uma mulher avançada para os padrões da época. Fumava e bebia em público, usava roupas transparentes, cabelos curtos, falava palavrões e mantinha diversos relacionamentos. 

Em 1925, com quinze anos, mudou-se para a capital paulista, onde trabalhou como redatora no “Brás Jornal”, assinando uma coluna com o pseudônimo de Patsy. Trabalhou, ainda,  no jornal “A Tribuna” e na “Revista de Antropofagia”.

Morou na Liberdade, no Brás, na Aclimação, na Bela Vista, no Rio de Janeiro e em Paris. Em 1933, estreia com o romance “Parque Industrial” (que teve a edição paga por Oswald de Andrade e é considerado o primeiro romance proletário brasileiro) com o pseudônimo de Mara Lobo; em 1945 escreve com o segundo marido, Geraldo Ferraz, “A Famosa Revista”; escreveu também contos policiais, sob o pseudônimo King Shelter, publicados originalmente na revista “Detective”, dirigida pelo dramaturgo Nelson Rodrigues, e depois reunidos no livro “Safra Macabra” (Livraria José Olympio Editora, 1998) e a autobiografia “Paixão Pagu”, seu único texto autobiográfico, escrito em 1940.

Apresentada ao casal Oswald de Andrade e Tarsila do Amaral, Pagu, aos 18 anos, se integra ao movimento antropofágico, de cunho modernista. Em 1923 casa-se com o escritor Oswald de Andrade e tem seu primeiro filho, Rudá de Andrade. Então, junto ao marido, se inicia na vida política, tornando-se militante do Partido Comunista.

Em 1933, partiu para uma viagem para a França, quando estreou como repórter, deixando no Brasil o marido Oswald e seu filho. Em 1935, em Paris,  fez cursos na Sorbonne e filiou-se ao Partido Comunista francês. Presa como comunista estrangeira, com identidade falsa, ia ser deportada para a Alemanha nazista, quando o embaixador brasileiro Souza Dantas conseguiu mandá-la de volta ao Brasil. Separa-se definitivamente de Oswald e então retoma a atividade jornalística.

Na volta ao Brasil é novamente presa e torturada pelos militares. Como inimiga política número um da ditadura de Getúio Vargas a artista foi presa e torturada 23 vezes. A primeira vez, em 1931. Na última, ficou cinco anos presa.

Em 1940, ao deixar a prisão, desencantada com o regime soviético, abandona a militância política no Partido Comunista. Aderiu ao trotskismo e incorporou à redação do jornal “A Vanguarda Socialista”, iniciando em 1946 a sua colaboração regular no Suplemento literário do “Diário de S. Paulo”. Em 1945, Patrícia casou-se com Geraldo Ferraz, jornalista da ‘A Tribuna de Santos’, cidade na qual passaram a viver. Nasce seu segundo filho, Geraldo Galvão Ferraz.

Em 1950 tenta, sem sucesso, uma vaga de deputada estadual. Em 1952, frequenta a Escola de Arte Dramática de São Paulo. Como correspondente de vários jornais, Pagu visitou os Estados Unidos, o Japão e a China. Entrevistou Sigmund Freud e assistiu à coroação de Pu-Yi, o último imperador chinês. Foi por intermédio dele que Pagu conseguiu sementes de soja, enviadas ao Brasil e introduzidas na economia agrícola brasileira.

Em 1988, a vida de Pagu foi contada no filme “Eternamente Pagu” (1987), no primeiro longa metragem dirigido por Norma Benguell, com Carla Camurati no papel-título, Antônio Fagundes como Oswald de Andrade e Esther Góes, no papel de Tarsila do Amaral.

Acometida de um câncer, a artista volta a Paris para se submeter a uma cirurgia. Sem resultados positivos, retorna ao Brasil. Por causa da doença, deprimida, Pagu tenta o suicídio. Sobre o episódio, ela escreveu no panfleto "Verdade e Liberdade": "Uma bala ficou para trás, entre gazes e lembranças estraçalhadas".

A artista  morreu em 12 de dezembro de 1962, aos 52 anos, na cidade de Santos (SP). Na véspera de sua morte, um último texto seu é publicado, o poema "Nothing".

“Nada mais do que nada
Porque vocês querem que exista apenas o nada
Pois existe o só nada".

Mas, como toda lenda, Pagu ainda vive. Viva Pagu!



*Ediel Ribeiro é jornalista, cartunista e escritor.


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