quarta-feira, 11 de outubro de 2023

O VOCABULÁRIO DOS TÉCNICOS

 



por Ediel Ribeiro 


Rio - Eu sou um jornalista antigo. 

Tão antigo, mas tão antigo, que, se não me engano, fui no 14-bis acompanhar o primeiro jogo da Seleção Brasileira, na estreia do time brasileiro na primeira Copa do Mundo. 

Acompanho futebol há muito tempo. Sou do tempo que goleiro se chamava guarda-redes. Assim, nada mais no futebol me surpreende. Mas, confesso, nunca pensei ver o corintiano, Tite no comando do Flamengo. Nem eu nem a torcida do Corinthians.

Macaco velho, para não ser pego de surpresa, logo que foi anunciado o acerto do treinador com o Flamengo, corri para fazer um curso de ‘titês’, por correspondência, no Instituto Universal Brasileiro,  para participar das entrevistas coletivas do professor Adenor Leonardo Bacchi, o novo técnico do Flamengo.

Acho que vou me sair bem. Afinal, eu já cobria o futebol  em 1989, quando Ricardo Teixeira assumiu o comando da CBF e trouxe Sebastião Lazaroni para assumir a seleção. 

E o novo comandante chegou usando termos, como ‘galgar parâmetros’, ‘intenção sinergética’ e ‘lastro físico’. O vocabulário logo ganhou o apelido de “lazaronês”.

Eu também cobria o Flamengo quando Cláudio Coutinho apareceu por  lá propondo essa tal modernização, engessando nossa língua, nossa criatividade, copiando o futebol europeu. Para passar seriedade, inteligência e já cavando uma vaga na Europa, Coutinho  chegou usando expressões chatíssimas, como “overlapping”, “ponto futuro” e “polivalência”. 

Outro que tentou engessar nossa criatividade, copiando o futebol europeu foi o ‘pofexô’ Luxemburgo. Por um tempo, foi difícil compreender o dialeto do ‘pofexô’. Quando desembarcou no Flamengo, com seu ‘pojeto’ de transformar o time no maior do mundo, ninguém entendia aquelas expressões, mais inúteis do que bolso de pijama.

Luxa, muito antes de Tite, trouxe um "dicionário" das expressões consideradas modernas do esporte atual para o futebol. Em 2014, Luxemburgo já pedia para os jogadores ‘fecharem a casinha’ e ‘pisar na área’. 

No "dicionário do Luxa", por exemplo, o simples "pressionar" após a perda da bola,  se tornou "diminui o espaço”; Já sair jogando  e "dá um chutão, c***, segundo o "Luxemburguês", se tornou, respectivamente, "jogo apoiado" e "sair da zona de pressão". 

Afeito ao discurso prolixo, carregado de neologismos e frases de efeito, as entrevistas de Tite  com certeza desafiaram a inteligência dos jornalistas, a compreensão dos jogadores e ainda confundiram os torcedores.  

Na apresentação, por exemplo, Tite se conteve para não dizer uma de suas palavras prediletas: "treinabilidade". Não é de hoje que o discurso politicamente correto de Tite causa risadas nos torcedores e jornalistas. 

Um dos métodos de Tite para incentivar o time é justamente a oratória. Tite é conhecido pelo seu vocabulário de frases de efeito. O ‘titês’, no entanto, tem prejudicado a comunicação do técnico com os jornalistas.

Para Tite, Garrincha não seria um ponta endiabrado, mas um “extremo desequilibrante”. Tite usa a expressão para se referir aos jogadores que atuam no ataque, como pontas, e são dribladores, que podem fazer jogadas individuais, que desequilibram a marcação adversária, criando chances de gol.

"Treinabilidade". De acordo com o técnico, 'treinabilidade' é a capacidade que os jogadores têm de evoluírem durante as atividades.

"Jogador terminal". É utilizado quando Tite se refere ao centroavante, ou seja, um jogador mais finalizador, que atua no ‘último terço’ do campo, perto do gol adversário, onde as jogadas terminam.

"Jogo apoiado". É a implementação de conceitos como a posse de bola, a aproximação de jogadores e a troca de passes para avançar ao ataque, com o jogador que tem a bola com opções para acionar companheiros.

“Performar”. É o entendimento de que a boa execução de uma atividade vai ter o resultado esperado.

‘Ritmista’ - que no meu tempo era o músico que ditava o ritmo nos desfiles das Escolas de Samba - é o jogador que dá o ritmo ao time, que arma as jogadas, que faz a “ligação direta” - que no meu tempo era roubo de carro - do meio com o ataque.

No dicionário “Titês”, o campo de jogo é dividido em três partes: primeiro terço, terço central e último terço. 

É muito terço! 

Por um lado, é bom. Vamos precisar de muita reza para não nos estressamos com o professor.

*Ediel Ribeiro é jornalista, quadrinista e escritor.






Nenhum comentário:

Postar um comentário