sexta-feira, 17 de junho de 2022

UM BAR CHAMADO ANTONIO´S



por Ediel Ribeiro


Rio - Uma das vantagens de ficar velho é ter histórias pra contar.

Jaguar lembra de todos os bares que bebeu e que hoje não existem mais. Até listou eles no livro “Confesso que bebi”. Eu lembro de poucos. Um deles, o Antonio´s. 

Quando o bar ‘Antonio´s’ fechou, em janeiro de 1997, levou com ele 30 anos de história da boemia do Leblon e um pouco da minha.

O boteco, frequentado por intelectuais e artistas como Tom Jobim, Vinicius de Moraes, Chico Buarque; os jornalistas Carlinhos Oliveira e Tarso de Castro; os escritores Otto Lara Resende, Paulo Mendes Campos e Rubem Braga; o pintor Di Cavalcanti; o cineasta Ruy Guerra; as atrizes Dina Sfat e Leila Diniz;  os cartunista Jaguar, Ziraldo, Nani, Hermé, Duayer  e por muitos outros famosos, era o bar da moda nos anos 70 e 80.

Fundado  pelos espanhóis Florentino e Manolo, nasceu oficialmente na noite de 11 de fevereiro de 1967, com o nome  de ‘Strangers in the Night’ - música de Frank Sinatra - na avenida Bartolomeu Mitre, 297 e logo tornou-se o território da “intelligentsia”. Mas o nome não agradou e durou apenas três dias. Mudou para Antonio´s, homenagem ao seu Antônio, cozinheiro do bar.

Naquela época, o  Antonio´s  já era um lugar especial, um altar de veneração ao uísque e de culto a boemia. Entre os habitués do Antonio´s, os mais assíduos era a turma do "Pasquim", que transformou a casa em uma redação informal do jornal.  O cronista do ‘Jornal do Brasil’, Carlinhos Oliveira chegou a instalar sua Olivetti na varanda do boteco, de onde produzia e enviava seus textos para o JB. 

Nomes internacionais como Mick Jagger, Candice Bergen, Simone de Beauvoir, Jean-Paul Sartre marcaram presença no boteco. Com tantos frequentadores ilustres, o restaurante acabou recolhendo um vasto folclore que virou livro, "Caleidoscópio de um Bar", escrito pelo publicitário Mário de Almeida. Carlinhos Oliveira escreveu “Um Homem na Varanda do Antônio´s”.

Um dos pratos favoritos era o Filé à Chico Buarque, receita que levava patê e mostarda na sua preparação. E foi passada ao Manolo, dono do boteco, entre um chopp e outro, pelo próprio Chico.

Mesmo com tantas celebridades flanando pelo local, um dos “personagens” mais famosos era o telefone do Antonio´s. Em tempos pré-internet, o telefone no balcão do bar era disputado pelos frequentadores para marcar encontros, namorar, mandar e receber recados e até enviar matérias para as redações.

Diz a lenda que Frank Sinatra ligava para o Antonio’s para falar com Tom Jobim. Outra história, envolvendo o famoso telefone do Antonio’s, conta que  a atriz norte-americana Candice Bergen, que tinha um affair com Tarso, falava com ele, de Nova York, pelo aparelho.

"Estou desolado. Foi meu segundo lar", afirmou o jornalista Sérgio Cabral, lembrando que, ao sair da prisão, em 1971, passou no Antonio's antes de ir para casa.

Ziraldo também  lamentou o fechamento: "Um bar é como o ser humano. Nasce, cria fama e morre", diz Ziraldo.

Tarso de Castro, o jornalista criador do Pasquim, e Carlinhos Oliveira, cronista e escritor, eram os “bebinhos” de estimação do Manolo, dono do boteco. 

Apesar disso, Carlinhos - ou Charlot como também era chamado pelos amigos de copo -  chegou a ser expulso do bar e só voltou a frequentar a casa depois de uma manifestação de alguns amigos do cronista que sentaram na entrada do bar, até que o cronista voltou a ser aceito.

Os dois eram o terror do boteco, mas, sem eles, o Antonio´s talvez ainda fosse o lacônico e obscuro ‘Strangers in the Night’.

*Ediel Ribeiro é jornalista e escritor.


Nenhum comentário:

Postar um comentário