sábado, 16 de outubro de 2021

ENQUANTO ELE CHORA NO BANHEIRO



por Ediel Ribeiro.


Rio - “Enquanto ele chora no banheiro”. Não, não é o título de um thriller de horror, desses que passam na Netflix.


Acontece - agora sabemos - na vida real, em Brasília.

Depois que, em um encontro organizado por uma igreja evangélica em Brasília, na noite desta quinta-feira (14), o presidente Jair Bolsonaro (PL), disse que chora sozinho no banheiro de casa, o país inteiro ficou comovido.

Nunca assisti aos acessos de crise que o presidente diz ter, trancado no banheiro do Palácio da Alvorada, mas posso imaginar que devem ser alguma coisa desse gênero:

- Papiiiiiiii!!! Papiiiiii! - grita o filho 04 do presidente na porta do banheiro, com um velho exemplar da ‘G Magazine’, com a foto do Vampeta estampada na capa, nas mãos.

- O que foi, menino? Pra que esse escândalo? Não está vendo que seu pai está usando o toilettes (rico gosta de usar o eufemismo, em francês)? - disse Michelle. 

- Usando, não, ele alugou o banheiro! Estou batendo na porta há mais de vinte minutos. Já pensei até em chamar a Defesa Civil ou o Corpo de Bombeiros. Vai que ele está atolado no vaso.

- Deixa eu ver - disse a primeira dama, afastando o rapaz e encostando o ouvido na porta. - Estou ouvindo um gemido.

- Será que ele está com prisão de ventre?

- Não. Seu pai faz merda com facilidade.

- E se foi por causa da facada? Deixa eu ouvir - pediu o O4, jogando, suavemente, para trás o cabelo que cobria a orelha.

Depois de alguns segundos o rapaz, cobrindo a boca com os dedos, num gesto afetado, sussurra:

- Acho que ele está chorando.

- Chorando?! Deixa eu ouvir... - pediu Michelle. - É mesmo. Ele tá chorando! Estranho, nunca vi seu pai chorando, exceto, claro, aquele dia, no colo do Temer, com medo  do STF. 

- Papito! Papito! - chamou o 04, batendo suavemente na porta. - Por que será que ele está chorando?

- Não faço a menor ideia. Seu pai não chora nem descascando cebola. Ele é machão, viríl... - disse a primeira dama, segurando o riso entre os dentes.

- Deve ser por causa dos mais de 600 mil brasileiros mortos.

- Não. Seu pai não é de chorar por qualquer besteira.

- Pela queda de popularidade?

- Não. Seu pai está acostumado. Ele nunca foi popular, nem no colégio.

- Pela alta do custo de vida dos brasileiros?

- Não. Seu pai não faz mercado. Nem sabe o preço das coisas.

- Pelos aumentos sucessivos do preço da gasolina?

- Menino, seu pai não paga gasolina, gás, aluguel, luz, passagem aérea...essas besteiras que os brasileiros comuns pagam. E as coisas que paga, ele debita no cartão corporativo.

- Então, só pode ser pela nova ordem de prisão do Roberto Jefferson. Eles são tão
ligados...

- Eu acho que é porque o Supremo proibiu ele, seus irmãos e seus amiguinhos de espalharem fake news. Ele adorava aquilo!! - diz Michelle.

Um evangélico comentou:

- É de cortar o coração, de nós, brasileiros, saber que o presidente chora no banheiro. Só não choramos também, em solidarieddade, porque não temos mais lágrimas, de tanto chorar na hora de abastecer o carro, pagar a conta de luz, de água, na hora de ir ao supermercado; na mesa quando falta carne, feijão, arroz; ao enterrar um ente querido, vítima da Covid-19; quando acaba o gás, quando falta vacina, médicos, saúde, segurança…


*Ediel Ribeiro é jornalista e escritor

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